Mais gestão, menos polarização Titulo Mais gestão, menos polarização
A bússola FHC
Paulo Serra
20/07/2025 | 08:11
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FOTO: Fernandes / DGABC Diário do Grande ABC - Notícias e informações do Grande ABC: Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra


Desde a redemocratização do Brasil, poucos períodos políticos foram tão marcados por tensões e rupturas institucionais quanto o atual. O País vive uma espiral de polarização e radicalização que contamina o debate público, fragiliza as instituições e transforma ex-presidentes da República em alvos recorrentes de disputas judiciais. Nesse cenário, chama atenção uma figura que, mesmo após décadas de vida pública, manteve sua biografia intacta: o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

FHC governou o País entre 1995 e 2002. Foi o único presidente eleito no período pós-ditadura que não enfrentou, após deixar o cargo, qualquer tipo de ação judicial, denúncia criminal ou investigação que manchasse sua trajetória. Esse dado, por si só, deveria servir como alerta e reflexão diante do quadro atual, em que praticamente todos os ex-presidentes eleitos após ele passaram a figurar em manchetes policiais.

Dilma Rousseff, sucessora de Lula, sofreu impeachment em 2016 em meio a uma crise institucional profunda. Embora não tenha sido alvo de condenações judiciais, sua imagem foi desgastada por acusações e processos ligados à sua gestão. Lula, por sua vez, foi condenado, preso e posteriormente teve suas penas anuladas por irregularidades processuais – mas o impacto político e simbólico permanece. E agora, em julho de 2025, é Jair Bolsonaro quem ocupa o centro das atenções judiciais, com decisões que o tornam inelegível e o colocam cada vez mais próximo de responsabilizações criminais.

É sintomático que, à exceção de FHC, todos os ex-presidentes tenham enfrentado graves turbulências jurídicas. Mais do que reflexo de eventuais erros individuais, esse fenômeno é um sintoma de um país aprisionado em disputas políticas sem fim, onde o adversário se torna inimigo e a alternância de poder se transforma em revanchismo.

É preciso reconhecer que todos os presidentes tiveram acertos e erros. Lula ampliou políticas sociais. Dilma buscou manter a inclusão com forte investimento público. Bolsonaro teve apoio popular significativo, especialmente entre setores conservadores. Mas todos também carregam decisões questionáveis. E todos acabaram tragados por um ambiente político que prefere o embate ao diálogo, a vingança ao consenso.

Fernando Henrique, nesse sentido, é uma exceção. Não apenas por sua postura institucional no pós-governo, mas também por ter deixado um legado de reformas estruturantes. Durante seus dois mandatos, o Brasil consolidou o Plano Real, domou a inflação, iniciou privatizações estratégicas, modernizou o Estado e estabeleceu a Lei de Responsabilidade Fiscal. FHC foi responsável por dar ao País a base macroeconômica que sustentou os avanços sociais dos governos seguintes.

Mais do que isso: soube se retirar da Presidência com sobriedade, respeitando as instituições, evitando alimentar crises e contribuindo com ponderação para o debate público. É exatamente essa racionalidade que falta ao Brasil atual. Hoje, o País precisa menos de heróis e vilões e mais de estadistas que saibam que o verdadeiro legado de um presidente não se mede apenas pelos anos no poder, mas pela forma como ele contribui para a estabilidade e o futuro do país mesmo depois de sair do cargo.

A radicalização tem custado caro ao Brasil – em credibilidade, estabilidade, desenvolvimento e até mesmo na preservação da história pessoal de quem ocupou o mais alto posto da República. Ao invés de transformar cada ex-presidente em réu ou mártir, o País precisa reencontrar o equilíbrio que permita o julgamento sereno da história. E, nesse esforço, o exemplo de Fernando Henrique Cardoso é uma bússola que não deveríamos ignorar.




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